A Semana do ano 2025

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Dois acontecimentos ficaram a marcar a passada semana: um, a nível nacional, com a dupla comemoração dos 51 anos da revolução 

do 25 de Abril e dos 50 anos sobre a realização das primeiras eleições democráticas no nosso país; outro, a nível internacional, talvez a constituir um marco na história desta década, que foi a morte do Papa Francisco e o seu funeral em Roma.

Sobre o primeiro, tivemos ocasião de mais uma vez e da forma do costume, assistir à realização da sessão solene da Assembleia da República na parte da
manhã e aos habituais desfiles na parte de tarde nas avenidas de Lisboa contando neste ano com a presença de forças extremistas que, não acatando a
proibição da manifestação naquele local, acabariam por se envolver em desacatos físicos com outros manifestantes também não autorizados para tal.

Para além das cerimónias comemorativas nacionais ocorreram também, um pouco por todo o país, cerimónias locais, geralmente com sessões solenes das
Assembleias Municipais, como foi o caso do nosso Município.

Quanto à sessão solene da Assembleia da República, com uma ou outra excepção, como Teresa Morais do PSD, ignoraram os partidos políticos, nas suas intervenções, os temas do dia relacionados, naturalmente, com os valores de Abril e a importância da democracia deixando-se antes arrastar para os falsos temas que têm contaminado os debates eleitorais dos últimos dias.

Na verdade, em vez de ouvirmos as diferentes perspectivas de cada força partidária sobre o enquadramento histórico dos eventos em comemoração e o
seu importante significado enquanto transformação radical do nosso regime político e seu impacto a nível social, cultural e económico, fomos empurrados
para questões menores que pouco ou nada dizem sobre os temas que nos afligem a nível nacional – demografia, ensino, saúde, justiça, defesa,
desenvolvimento económico – assim como à preocupante envolvente mundial que nos últimos anos tem sido objecto de uma transformação abrupta da ordem internacional.

A este propósito e ao nível local, muito me agradou a intervenção do jovem representante do CDS na nossa Assembleia Municipal que, para além de um
discurso muito bem elaborado, teve ocasião de o proferir de forma brilhante.

Sobre o segundo, a partida para a eternidade do Papa Francisco, apesar do conhecimento tido sobre a debilidade que o afligia, foi com enorme surpresa com que todos fomos surpreendidos na segunda-feira, logo de manhã, com a morte do Santo Padre depois de termos assistido, no domingo de Páscoa, ao seu aparecimento e à sua bênção “Urbi et Orbi”.

Assistimos, praticamente toda a semana, a desenvolvidas reportagens televisivas falando-nos sobre os principais feitos e características do seu pontificado no qual, para além das três profundas e ricas encíclicas publicadas e muitos outros documentos, foram assinaladas as suas mais de 40 viagens internacionais, a primeira das quais ao Brasil em 2013, logo após a sua eleição, aquando da realização da Jornada Mundial da Juventude do Rio de Janeiro, com a presença de mais de três milhões e meio de pessoas, e demuitas outras, de entre as quais merecem especial destaque a histórica e muito simbólica viagem apostólica ao Iraque em 2021, assim como a realizada em 2023, aquando da realização da Jornada Mundial da Juventude de Lisboa, com a presença de um milhão e quatrocentas mil pessoas.

Sobre a pessoa do Papa Francisco e de seu pontificado quase tudo terá sido já dito, ficaram-me, contudo, sempre na memória, as palavras proferidas pelo
falecido Patriarca de Lisboa, D. José Policarpo, que afirmou ter lembrado a Francisco, logo após a sua eleição, para nunca se esquecer dos pobres e marginalizados tal como ele, cardeal Jorge Bergoglio, havia defendido nasCongregações Gerais como importante papel da Igreja.

Na verdade, ver um jesuíta adoptar o nome Francisco, do fundador da Ordemdos Franciscanos, fazia adivinhar ao que vinha: marcar o foco no desprendimento dos bens materiais, na misericórdia, no amor ao próximo e ànatureza, numa palavra, na doutrina de Jesus Cristo expressa claramente esobretudo nos Evangelhos.

Ao longo da minha vida tive o privilégio de ter estado pessoalmente com váriospapas. Com Paulo VI, em 1967, aquando de audiência à família; mais tarde,em Junho de 1985, pelos 50 anos de matrimónio de meus pais, uma manhãcom o Papa João Paulo II, na sua residência de férias em Castel Gandolfo, na qual para nós celebrou a santa missa de “acção de graças”, concelebrada com meu irmão; já na fase final de sua vida e aquando da beatificação de Alexandrina de Balazar tive ainda a possibilidade de o cumprimentar no final das cerimónias na praça do Vaticano; mais tarde, em cerimónia no auditório João Paulo II, participei também em audiência geral com Bento XVI; finalmente, tive a possibilidade de cumprimentar o papa Francisco numa celebração napraça de S. Pedro e, no dia seguinte, ter sido por si recebido no final de uma celebração na capela de Santa Marta, momento em que tive oportunidade de lhe oferecer um lindo livro sobre o centro histórico, já Património Universal, da nossa rica cidade o qual posteriormente me veio a agradecer. Diante de todos eles senti estar perante um ungido do Senhor.

Na verdade, a presença do Espírito Santo nos Conclaves tem-nos concedido a graça de ter dignos sucessores de Pedro, como nos últimos sessenta anos,
começando com um grande diplomata, ex-núncio em Paris, e corajoso papa, João XXIII, que sentindo a necessidade da renovação da Igreja lançou o grande concílio Vaticano II, o qual, de entre muitas transformações, substituiu o latim das missas pelas línguas de cada país, permitindo a participação activa das assembleias nas celebrações.

Concedeu-nos depois um grande pastor, capaz de promover a transformação do mundo em termos sociais e até mesmo políticos (libertação dos países sob
ditaduras comunistas da europa oriental), João Paulo II, o precursor das viagens apostólicas que começaram a galvanizar os vários continentes com a sua primeira viagem ao México em Janeiro de 1979 para inaugurar a III Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano, realizada em Puebla e carregada de peripécias desconhecidas do grande público.

A consolidar o rebanho, suceder-lhe-ia um grande teólogo, Joseph Ratzinger, ex-Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, com o nome de Bento XVI, um nome a manifestar, desde logo, a sua admiração por um dos maiores vultos do cristianismo, Bento de Núrsia, o nosso grande S. Bento, o monge autor da Regra com o lema – Ora et Lavora - que viria a servir de regulamento para a generalidade dos conventos, em profunda difusão pela europa em cristianização com o Império Romano, papa que viria a fazer despertar em mim o gosto pelo aprofundamento dos meus parcos conhecimentos sobre a Igreja de Cristo com a leitura de vários livros publicados como: S. Bento Padroeiro da Europa, os três livros sobre Jesus de Nazaré, Jesus Luz do Mundo e Paulo o Apóstolo dos Gentios.

Depois, e para fazer regressar a Igreja ao seu foco original, tivemos a graça de ter novamente um grande pastor, todo ele muito próximo das pessoas, com uma linguagem simples e directa, o Papa Francisco, agora preocupado em trazer a Igreja de Cristo ao foco por Ele apontado nos evangelhos: os pobres, os oprimidos, as vítimas das injustiças. A Igreja da Misericórdia, de braços abertos a todos, sem marginalizar ninguém, sempre pronta a ajudar e a perdoar. Ele próprio exemplo para os pastores diocesanos aos quais lembrava que para serem bons pastores deveriam cheirar mais a ovelha.

Oxalá que a oração de todos, de modo especial dos cardeais do Conclave, possa obter novamente a graça do Espírito Santo na escolha do novo sucessor de Pedro de modo que a comunidade mundial possa beneficiar da sua ajuda nestes conturbadíssimos momentos que afligem o mundo.

Guimarães, 29 de Abril de 2025
António Monteiro de Castro

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