Guerra na Europa

Depois de uma terrível pandemia que durante os últimos dois anos contagiou aproximadamente 3.200.000 portugueses e provocou 21.000 mortos

e que no mundo inteiro atingiu 424.000.000 de pessoas e quase 6.000.000 mortos, eis que surge uma nova variante do vírus Sars-CoV-2 – Ómicron - muito mais contagiosa, mas muito menos agressiva, anunciando a aproximação do restabelecimento da normalidade do quotidiano da vida das pessoas.

A par desta boa notícia, foram vindo ao de cima, progressivamente, as primeiras consequências das várias paragens e confinamentos que os momentos mais graves da pandemia provocaram.

Para além das consequências relacionadas com cuidados de saúde que ficaram adiados, de aprendizagens ao nível académico não realizadas, também ao nível económico se começou a sentir o profundo desequilíbrio entre a oferta e a procura, seja de bens de consumo, seja de bens duradoiros.

Na verdade, os diferentes períodos de paragem da actividade económica, sobretudo a industrial, provocaram queda de produção agravada pela paralisação dos meios logísticos em virtude da imobilização dos meios de transporte.

As cadeias de produção viram-se, assim, confrontadas, com falta de produtos necessários à fabricação, evidenciando-se a dos semicondutores, assim como com o aumento significativo dos custos de produção em consequência da subida dos preços do gás, do petróleo e da electricidade.

Por outro lado, o consumo disparou, não só em consequência da prolongada contenção a que os diferentes confinamentos obrigaram, como pela política fortemente expansionista promovida pelos estados e pelos bancos centrais com taxas de juro negativas e enormes subvenções.

Como consequência directa deste desequilíbrio entre oferta e procura, reapareceu a já esquecida inflacção dos anos setenta e oitenta, agravada pela crise energética entretanto aparecida, decorrente não só do aumento do consumo, como também, do fecho das centrais térmicas a carvão e, no caso português, pela paragem da produção hídrica em consequência da seca que nos encontramos a viver.

Com inflacção a ultrapassar os 5,0 %, ameaçando mesmo, num horizonte próximo, sobre o efeito da crise energética, poder atingir os dois dígitos, não restará ao Banco Central Europeu outra medida que não seja reduzir, progressivamente, a cedência de liquidez ao mercado (Quantitative easing), assim como, aumentar as taxas de juro.

Péssimas notícias para Portugal, país fortemente endividado, que tem conseguido equilibrar as suas contas públicas à custa desta política do BCE, assim como, péssima também, para muitas empresas e para muitos portugueses que, em situação de dívida elevada, serão agora confrontados com custos a que não estão habituados.

Se já não eram poucas as preocupações decorrentes desta situação de desequilíbrio do mercado e inflacção associada, acrescida da perigosa luta pela hegemonia económica e tecnológica entre Estados Unidos e China, assistimos agora, em plena Europa, a uma escalada assustadora de ameaça de guerra entre Rússia e Ucrânia, iminente a todo o momento.

No seguimento do desmoronamento da antiga URSS e da adesão à democracia de muitos dos estados dessa antiga união, a aproximação geográfica da democracia aos restantes estados autocráticos despertou nos seus responsáveis reacções desesperadas de sobrevivência face ao potencial contágio que tal aproximação possa vir a espoletar. Bielorrússia e Rússia são exemplos flagrantes de estados cujos responsáveis políticos tentam, desesperadamente, lutar contra os ventos da história.

Sendo certo que em Outubro de 1962, também o presidente dos Estados Unidos da América, John Kennedy, tenha entendido a instalação de mísseis nucleares Soviéticos em Cuba, como um acto de guerra contra os Estados Unidos obrigando à sua retirada, no caso presente, a adesão da Ucrânia à NATO não teve lugar, assim como não terá lugar qualquer intervenção de sua parte.

A desejada invasão da Ucrânia por parte da Rússia representará, isso sim, a nostalgia pelo seu passado imperial e seu ressurgimento, a par da preocupação com a possibilidade da conquista da democracia pelos seus amordaçados povos.

A História tem demonstrado a tragédia a que o desespero de ditadores muitas vezes conduz.

Assim a diplomacia consiga aplacar a inconsciência de tiranos que vêm pondo em sobressalto milhões de europeus.

Guimarães, 22 de Fevereiro de 2022
António Monteiro de Castro

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