Fatalidade?

Com as alterações climáticas a aumentarem e a confrontarem-nos todos os dias, o ambiente social, pelo menos por estas nossas bandas, parece querer acompanhar o decurso da anomalia

do processo terrestre e, sobremaneira, deteriora-se de forma crescente com a exacerbação decorrente do constante bota abaixo dos média (e não só, que as redes também ajudam). Isto porque aqueles se focalizam em faits divers à exaustão e assim, de algum modo, levam à desatenção do que é realmente importante para a solução de problemas existentes e para projectar a resolução de outros que pendem sobre o nosso horizonte. Em suma, para se poder fomentar um progressivo devir de melhor bem estar.
Isto porque, envolvidos em questiúnculas meneadas por intenções de um pretenso, mas duvidoso, não posicionamento ideológico e altamente apetecíveis para uma sociedade de literacia mais que reduzida e ávida de denúncias sensacionalistas, eles vão, com essa sua permanente prática, ateando fogos a torto e a direito; fogos que se mantêm enquanto há oxigénio que os consinta. E tudo numa rota dita de exercício da vera democracia, mas que e na sua continuidade, acaba por ajudar a gangrenar a autêntica democracia. Com outra agravante ainda e já aflorada acima, a de desviarem a atenção daquilo que devia ser a persecução do interesse colectivo, originando assim, quantas vezes, decisões precipitadas e talvez, até, oportunistas. Minando, portanto, a paz social e a serenidade necessária para o consistente, e que se quereria persistente, debate democrático.


Ora, para quem entenda que a biosfera é de origem material e provinda das profundas de um primeiro surgimento (segundo o conhecimento actual, o Big-Bang), com um seguinte desenrolar gradual e potencialmente mais complexo segundo uma sequencialidade consequente, os efeitos contêm e verificam-se sempre pela conclusão do absoluto das suas causas. E destarte em um qualquer fenómeno social concorrem todas aquelas que o viabilizam. Como o desta deriva dos média que é um fruto do sistema, do cada vez mais questionado, mas imperante, neoliberalismo. E esta afirmação não comporta uma qualquer motivação conspiracionista. Não! Pelo contrário, é o tema que em crescendo tem vindo a ser abordado, e tratado, por muitos especialistas, numa panóplia que vai de filósofos a historiadores e sociólogos (passando, como não podia deixar de ser, por economistas). E que todos se têm debruçado sobre o ideário saído da Société du Mont-Pèlerin e dos demais seus impulsionadores. Não se trata, portanto, de uma proposição invencionista e tentativa manipuladora, até porque a manipulação está do outro lado, o do efectivo poder, como a abundante bibliografia, ensaios, conferências, entrevistas e outros modos de difusão têm vindo a dar à luz.

Convenhamos e compreendamos, portanto, que esta conduta dos média e nas redes, é um efeito natural do sistema. E é nesse sentido uma fatalidade, ainda que assaz subalterna.
Mas há mais destas derradeiras e, provavelmente, muitíssimo mais preocupantes.
Assim e mudando a agulha da linha para essa via, para as não nomeadas, deparamo-nos, entre outras, com a inteligência artificial (IA) que, recentemente, deu azo a alertas a chamarem a atenção para eventuais seus inconvenientes, ou mesmo perigos e um (só?) pedido de moratória para os trabalhos em curso nessa área. Os seus promotores, gente do meio ou em conexão com ele, são peremptórios na necessidade de uma ponderação aturada sobre o presente seu desenvolvimento.

Mas o que é a IA.
Ab initio e seguindo o mesmo percurso da anterior divagação (o mesmo princípio da sequencialidade consequente), não se descortina razão para o ápodo de artificial.
Porquê?
Porque o processo evolutivo terrestre que originou a biosfera e, nesta, há algumas centenas de milhares de anos atrás, a espécie humana (homo sapiens), não exclui dele toda a restante matéria massiva planetária e, portanto, todos os elementos e seus compostos ocorrentes que, assim, são tão naturais como aquela parte dele que consiste no que vulgarmente se conceitualiza como matéria viva. Sendo que esta, no entanto e na sua essência mais básica, não é mais do que (como, insiste-se, o todo do planeta) partículas elementares e energias. Não parece, por conseguinte, haver uma qualquer razão para, consoante a origem biosférica ou não, classificar de artificiais coisas que são tão reais como as consideradas animais. No entanto esta diatribe é de somenos importância.

Sim, que o problema que está em cima da mesa e é susceptível de alertas tem outra dimensão e localização; para alguns (± 10%) pode mesmo ser vital. E em que consiste? Simplesmente na suplantação da nossa espécie. Como? Na forma potenciada como a IA vem aumentando as suas capacidades de se equiparar, e porventura ultrapassar, as do cérebro humano. Isso quer no seu património colectivo (conhecimento e dados exteriores), quer no funcionamento individual (percepção, análise - indutiva e dedutiva - e criatividade). E como não tem as limitações dimensionais do órgão humano, cujo volume e estrutura, ao presente, não permitem ampliações significativas, ao contrário do que sucede nos instrumentos que estão a ser desenvolvidos e que, em algumas funções, já não admitem qualquer equiparação pela extensão que nelas alcançaram. A interrogação que se põem é, portanto, a de se perceber se esses instrumentos sê-lo-ão apenas e tão só, ou poderão autonomizar-se, deixando de depender do seu criador, do sapiens sapiens? E o que pode daí advir nesta última perspectiva?
Sem resposta que, parece, ainda não a há, ficcione-se.

Assim, como se sabe pela História, o sapiens começou pela apropriação do fogo, fabrico de instrumentos rudimentares, criação da roda, sedentarização, utilização de metais, alargamento desmedido dos instrumentos e materiais numa evolução em progressão que a máquina de vapor ainda mais acentuou, seguindo-se o aproveitamento e domesticação de energias (da electricidade à combustão, fusão e solar), computação, robótica e IA. Num percurso sequencialmente consequente que, desde os primeiros organismo vivos, nos trouxe a este presente. Um processo material que como o do seu todo, o do Universo, teve um início e, crê-se, terá um termo. Ora e como não se vislumbra uma acentuada evolução biológica no homem, mas o processo material do planeta ainda deve ter muito para andar, pode perguntar-se se este não aponta para a sequência de instrumentos mais capazes para o prosseguirem?
Não só na Terra, mas no sistema solar e ... quiçá

Fundevila, 14 de Abril de 2023


terça, 25 abril 2023 09:14 em Opinião

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